25 de mai. de 2008

Mudança

Estou relembrando o quanto é mentalmente estressante o processo de empacotar caixas. Já faz umas duas mudanças que minha vida é feita de empacotar tudo que eu tenho (ou tive) em pequenas cápsulas do tempo e deixar na parte mais funda do cômodo mais distante da casa, esperando a hora milagrosa de abrir e olhar. Geralmente, em cada mudança eu as abro, retiro algumas coisas visivelmente inúteis, jogo no lixo e reempacoto tudo.
Dessa vez fui obrigado, por conta da minha cia. telefônica predileta, a abrir tudo, revirar e olhar minuciosamente todos os papéis (que não são poucos mesmo) em busca de contas, recibos e extratos do fatídico ano de 2005, conhecido mundialmente como o ano dos Grandes Cataclismas, regido astologicamente pelo Cadavérico Senhor dos Infernos e da Colérica Desgraça Mundial. Já que eu estava com a mão na massa, o trabalho simples de reempacotar, acabei por aceitar esse castigo do destino de desenterrar os mortos.
Recados pra mim mesmo, do tipo "Ligar para fulano às 10h", ou "Reunião HOJE". Telefones anotados em papéis, sem o nome da pessoa tem de monte também. Mas os com nome chamam mais atenção: desde os dos mecânicos do Nicanor até o de um cara que vendia produto de limpeza numa kombi que queria que eu fizesse uma gravação pra ele deixar rolando em cima do carro. Extratos, notas fiscais de compra de eletrodomésticos, aparelhos de celular, entre outras coisas.

Parece que foi tudo uma vida à parte e que eu nunca vivi aquelas coisas, até olhar pra elas e pensar "Ah é...".

Borrachinhas de carro velho, anotações de idéias milagrosas para o sucesso, soldados de chumbo, peças velhas de computador velho, umas fôrmas para fazer vela, máquina fotográfica velha, uns gibis, revistas de videogame, um monte de tsuru espalhado, roupas minhas, roupas que não sei de quem são, roupas que eu sei de quem são mas viraram minhas, coisas que um dia fizeram sentido e hoje não fazem mais, outras coisas que nunca fizeram sentido mas hoje, olhando pra elas, fazem mais do que eu imaginava ser possível.

Falando nisso, tem umas coisas que eu preciso te devolver.

E as pessoas e as coisas hoje, ao meu redor, ainda que [algumas || às vezes] sem saberem, acabam por me propôr um milhão de alternativas de vida, de modo de ser e pensar. Mal sabem todas elas que nesse exato minuto eu estou me olhando em um espelho polidimensional que, ainda que de maneira dolorida (com murros com luva de pelica e pontapés com sapato de camurça) ele me mostra, ou até melhor, me lembra, do que sou e, o mais importante, porquê.
E eu já tinha esquecido mesmo. E até pouco tempo atrás eu me via somente como um produto final dessa massaroca esquecida.
E a minha luta eterna para nunca chegar nessa situação atual, onde eu me vejo assim, sem nada, sem nenhum bem, sem nenhum alguém, sem faculdade, sem CLT, sem nenhuma dependência ou dependente, acaba se mostrando uma coisa até benvinda. O que pra mim sempre foi um pesadelo, hoje é o que me deixa livre para fazer qualquer coisa que eu quiser. Qualquer coisa. Até mesmo pegar um avião que me deixe em qualquer ponto do lado de lá do Atlântico.

Mas esse interlúdio tem sido cansativo demais por não poder deixar de pensar nas coisinhas pequenas hoje são realidade na minha vida, nos trabalhinhos, nos nhenhenhezinhos, etc., e ainda assim ter que ficar brincando com o tal do meu espelho poligonal imaginário.

Em um mês posso me considerar um desalojado. Endividado um pouco, talvez (O velho erro de dar mais do que tenho, eu ainda pago por isso. Depois de 4 ou 5 vezes, espero ter aprendido). Entre possíveis mestrados, possíveis visitas transatlânticas, possíveis novos trabalhos, possíveis expectativas, tudo o que me resta é o fator comum que liga todas essas incertezas: o adjetivo "possível". E isso, nêgo, É IMPAGÁVEL!!